quarta-feira, 23 de abril de 2014

Mudando de CEP

Por MJ Taragano


Mudanças são sempre muito cansativas… Claro que existe o fator de euforia por ir para um lar novo, novinho em folha. Quando todo montadinho, sob medida para nossa felicidade então, nem se fala. Mas, para se concretizar, a mudança passa por vários processos desgastantes, dentre eles, a obra (sobre esta, nem comento!) e a famosa “faxina”.

Abrem-se armários, gavetas, caixas e todos aqueles pacotes que você um dia guardou e já não sabe mais para quê. - Só para se aporrinhar um dia? – Nem se imagina o que existe mais no fundo daqueles armários. Bem, imaginar, pode até imaginar, mas como se engana! No meu caso, que saio de um apartamento cheio deles e onde viveram muitas pessoas da família, o conforto de saber que o apartamento estava sempre passando para um parente, permitiu o luxo, aos moradores anteriores, de acumular ao longo dos anos um sem número de lembrancinhas, documentos, cartinhas, brinquedinhos antigos... “Ah, vou deixar essas coisas aqui, não atrapalham né?”. Eu mesma fui uma dessas que saiu, deixando rastros para minha Irmã, mas voltei, ela saiu e, um tempinho depois... próxima mudança! Mas quem virá agora? Socorro!!! Não é um parente!!! E agora? O que fazer com todas essas tralhas???  E distribuo senhas para a família entrar e recolher, selecionar, descartar suas ... coisinhas... E haja coisinhas...

Tomei como minha a tarefa de fazer, ao mínimo, a primeira limpa. E aí eu acho que descobri para que servem aqueles embrulhos que nunca abrimos, e dos quais não abrimos mão.  Ou melhor, só abrimos quando fazemos mudança, ou mudanças... só lá pela segunda ou terceira rodada é que resolvemos desvendar o que há dentro daqueles sacos, caixas, envelopes... é que, pra certas coisas, é preciso ter tempo para a despedida... mais ainda, essas coisas têm um papel ao longo das mudanças. Quando abrimos as caixas, abrimos espaço para rememorar... E justamente quando gostaríamos de ter uma casinha “clean”, a “lixarada” traz, além de outras coisas, as quais não cabe citar aqui, um pedacinho de saudade guardada nos cantinhos dos armários, uma pontinha de amor, um resquício de um tempo que passou e do qual pouco ficou, do qual não lembraríamos nada se não fosse aquele pacotinho guardado “por pena de jogar fora”, “para acaso algum dia precise”...

Em meio à zona, surgem brinquedos, cartas e postais (veja só!!! CARTAS!!! POSTAIS!!!), e entre eles, bilhetinhos da época da escola, cartões da Vovó, desejos de um bom ano, mensagens de saudades de quando fui estudar fora, despedidas, reencontros... e aquela cartinha, da adolescência, de um amigo meu contando como achou a minha mais nova amiga “fofa”! - Casaram-se treze anos depois.

E no mutirão, meu Pai se emocionou ao encontrar o livro de ponto da loja do meu Avô, cujo primeiro registro devia ter mais de 40 anos e cujas fotos dos funcionários pareciam ter sido tiradas de um filme antigo, romântico – nada se comparam às fotos dos crachás de hoje, as pessoas se arrumavam para os flashes! E o fotógrafo também...

E aí, desvendo o mistério do porquê de guardarmos tantas coisas. Para quando vierem as mudanças ou as faxinas. Em meio à trabalheira, surgirão gostosas lembranças de velhas amizades, de brincadeiras, de pessoas esquecidas ... uma fração da infância... como se gavetinhas mentais fossem sendo abertas jorrando emoções para nossos corações, deixando o estresse da mudança de lado por alguns instantes. Guardamos para termos sempre caquinhos de outras épocas e nos apercebermos de que todo esse processo trabalhoso é só a superfície de um monte de emoções que ainda estão por vir.